quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Envelhecer






Deixa-me envelhecer a teu lado

No velho monte onde o vento

Compõe melodias nos fios do teu cabelo,

Como finas cordas dum violoncelo.

Deixa-me envelhecer contigo

Onde o futuro são os teus dedos nodosos

Enlaçados nos meus, como no escuro da terra

Se agarram as raízes deste velho carvalho que nos dá abrigo.

Sentados no alpendre, vou ler-te os meus poemas.

Ri-te comigo dos meus versos coxos

E das rimas desajeitadas,

Das palavras que não sei dizer

Mas que me enchem os olhos e só tu sabes ler.

Que o nosso desejo enrubesça

Como aquelas laranjas penduradas no crepúsculo

E cresça com o incendiar súbito do pomar ao sol nascer.

Deixa-me envelhecer contigo,

Troça das rugas que tento esconder

E que te encantam em segredo.

Canta comigo uma qualquer ária

Ao som sincopado e cúmplice das cigarras

Escondidas no arvoredo.

Deixa-me adormecer no teu peito

E sonhar na eternidade,

Enquanto o tempo entretece os nossos dias

Em perene serenidade.

E quando partires, numa qualquer alvorada de chuva,

Leva-me contigo, toma a minha mão,

Porque eu sou parte tua,

Tua víscera ou teu sangue, eterna namorada,

Ou quem sabe, metade do teu coração.

Coração



Coração.

Meu.
Cansado.

Ferido.

Encolhido, 
na palma da tua mão.

Perfeito.

Imperfeito.

Inseguro

Mas puro.

E assustado,
num peito que não é meu.

Coração.

Roubado.

Ateu.

É teu!